Wilson da Costa Buenor*
A Comunicação
Rural, enquanto área de estudos e de interesse profissional,
tem, gradativamente, perdido espaço no Brasil, ainda
que esse fato pareça contraditório, tendo
em vista a nossa secular vocação pela agricultura.
Há, com certeza, inúmeros motivos que justificam
o cenário desfavorável para a Comunicação
Rural em nosso País.
Em primeiro lugar, é inquestionável a redução
drástica da oferta de disciplinas ou mesmo conteúdos
básicos sobre esta modalidade da Comunicação
em nossos cursos de graduação, derivada da
falta de sensibilidade de chefias de departamento das faculdades/escolas
de comunicação e do declínio de professores/pesquisadores
nesse campo. Tradicionalmente, a disciplina de Comunicação
Rural esteve sob a responsabilidade de profissionais identificados
com a problemática rural, muitos deles com formação
em Sociologia (Sociologia Rural, Sociologia do Desenvolvimento),
mas, pouco a pouco, com o esvaziamento da formação
básica nos cursos de Comunicação, esta
contribuição passou a ser menos frequente.
Mesmo nos cursos de pós-graduação em
Comunicação (Lato ou Stricto Sensu), são
raras as linhas de pesquisa ou mesmo projetos que tratam
deste campo e, portanto, é cada vez mais difícil
encontrar docentes e pesquisadores que tenham a área
rural como objeto de estudos ou de investigação.
Em segundo lugar, a emergência do modelo desenvolvimentista,
calcado no agronegócio exportador, deslocou as preocupações
dos estudiosos para outros focos, quase sempre associados
à economia agrícola e, em função
disso, as questões sociais, culturais e de comunicação
vinculadas ao mundo rural acabaram ficando relegadas a um
segundo ou terceiro planos. Sobretudo, a mídia passou
a se ocupar prioritariamente com a expansão das monoculturas,
na maioria das vezes contemplando esse processo sob uma
perspectiva acrítica, comprometida com os grandes
interesses que rondam o campo.
Finalmente, houve um esvaziamento do debate político
que sempre caracterizou a luta pela reforma agrária,
com a demonização dos movimento sociais no
campo, e um silenciamento gradativo das vozes que defendem
os interesses dos trabalhadores rurais. A imprensa, refém
de fontes conservadoras e lobbies empresariais, inseriu
a luta pela posse da terra nas editorias de polícia
e concentrou a cobertura nas editorias de economia, que,
com um viés típico, passou a enxergar a agricultura
apenas como território do "management",
dos grandes negócios agrícolas. É nestes
espaços que plantação de eucaliptos
é denominada de floresta (bela diversidade tem os
eucaliptais!) e os indígenas acusados (que falta
de visão histórica!) de invadirem as terras
dos fabricantes de papel e celulose e mineradoras.
O agravamento da questão ambiental e, em particular
no Brasil, a sua relação com a expansão
das monoculturas (cana, soja, eucalipto etc), podem trazer
à tona novamente a discussão sobre a comunicação
rural, recolocando o homem do campo como protagonista. Além
disso, o fortalecimento da agricultura familiar, fundamental
para a sustentabilidade e a segurança alimentar,
resgata a contribuição dos pequenos agricultores
e redimensiona o espaço para o estudo e a pesquisa
da comunicação que está à margem
dos meios de massa.
A Comunicação Rural pode, neste contexto,
recuperar a sua vitalidade e emergir com um novo modelo,
mais democrático, comprometido com os valores da
cidadania planetária que todos almejamos, e distante
da postura funcionalista que imperou nas décadas
de 60 e 70, dando guarida ao avanço dos arautos da
insustentável Revolução Verde (a abominável
Fundação Rockfeller e seus pelegos).
Urge estarmos empenhados para que isso aconteça,
evitando que se consolide esta visão transgênica,
não diversa ou plural, egoísta e mesquinha,
que reduz a multiplicidade de vozes e saberes do mundo rural
brasileiro a uma perspectiva meramente mercantilista, identificada
com setores agroindustriais poderosos.
Estamos engajados na contra as monoculturas da mente, sistema
conceitual e ideológico praticado por empresas predadoras,
interessadas apenas em aumentar os seus lucros mesmo que,
para isso, tenham que atentar contra a saúde dos
trabalhadores e provocar a degradação do meio
ambiente.
A comunicação rural deve sobrepor-se à
comunicação para o agronegócio que
não inclui uma visão crítica dos nossos
problemas e que apenas se compromete com este modelo socialmente
injusto e moralmente condenável.
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*Wilson da Costa Bueno é jornalista, professor do
Programa de Pós-Graduação em Comunicação
Social na UMESP e professor de Jornalismo na ECA/USP. Tem
especialização em Comunicação
Rural pelo Ministério da Agricultura e é mestre
e doutor em Ciências da Comunicação
pela ECA/USP. Editor do site Comunicação Rural
on line e de outros sites temáticos em Comunicação/Jornalismo.